O Namoro
“E um dia o amor começa, pelo que o povo canta:
Quem pintou o amor cego,
não no soube bem pintar;
o amor nasce da vista,
quem não vê, não pode amar.
Todo ele se derrete, não tira os olhos dela, dando razão a quem diz que a “come com os olhos”. Cedo ou tarde, após as negaças do “seguro morreu de velho”, se não é logo de começo, por cima de toda a prudência, ela aceita o namoro, toma o derrete com ele. Principiam os amores. Depois da corte, do rapapé, do arrastar da asa, do pé de alferes, e tantas outras expressões sugestivas, com que o povo esquematiza o facto, a moça rendeu-se, dá sorte, liga-a toda, dá-lhe trela ou conversa.
Em linguagem aforística, tudo se reduz a um dos dois casos prováveis: — “ver-te e amar-te foi obra de um momento”; “mais vale o sim”.
Os três reis foram guiados
por uma estrela do céu;
também teus olhos guiaram
meu coração para o teu.
Eu não sei que simpatia
meus olhos contigo têm:
quando estou à tua beira,
não me lembra mais ninguém.
Então finalmente, depois do prólogo amoroso, cumpre ao namorado seguir o caminho do conselho que diz: — «por jeito se quer a moça, e não por força». A lição vem de dentro, porque:
A amar e a escolher
ensinou-me quem podia:
a amar foi a natureza,
a escolher a simpatia.
Luís Chaves
O Amor Português,
Livraria Clássica Editora, 1922,
Pág. 14