Travessa: Nº de inventário: 566;
comprimento 36,3cm; largura 26,3cm
Colher: N.º de inventário: 4360
comprimento 19,7cm; largura 4,2 cm
No passado, o povo português era um povo pobre, muito pobre. O grande objetivo da maioria das famílias era conseguir os meios suficientes para “matar a fome” aos filhos. Comiam-se os produtos cultivados diariamente, quase sempre em terras “de renda”: batata, feijão, favas, ervilhas, couves... e o mais que a terra dava, sem esquecer o pãozinho de Nosso Senhor. A panela de ferro de três pernas onde se fazia o caldo, respondia como podia às exigências de todos. Umas couves e mais qualquer coisa “a enludrar” dava para encher as malgas que passavam de boca em boca.
A hora da ceia, reunida a família, era a hora importante do dia. A mãe fazia milagres depois de voltas para inventar com que, para além do caldo, pudesse encher a travessa ou a padela à volta da qual todos se sentavam nos bancos de pau em perfeita adoração e, qual sacerdotisa, ali dispunha o melhor que podia as vitualhas possíveis, à noite, por via de regra, as costumadas batatas com umas folhas de couve e um fio de azeite. Cada um se armava como podia para aquela batalha: uma colher de torga, de lata ou de alumínio, quando não um simples espeto que também servia, no tempo, para desfolhar as espigas.
Quando a sacerdotisa dava ordem para avançar, o primeiro era o pai, depois os filhos e cada um retomava o seu lugar esperando por nova vez. No fim, quando já não havia mais, ainda se rapava o fundo, rapava, rapava... não sobrando nem um cibalhinho, nem um átomo, diríamos hoje. Esta preciosa travessa de barro vidrado, documento precioso para falar do povo português, e de nosso especial carinho, mostra como até o vidro foi comido, de tanto que foi rapado. E a colher também ia encolhendo de tanto rapar, rapar.